domingo, 9 de outubro de 2011

Condição Humana




Preso em mim. Dentro de uma cela podre, fétida, úmida e fria. Diante do escuro, muito escuro, a única visão que eu tinha era de mim mesmo. Estava sentado no chão. Encontrava um resquício de conforto abraçando minhas cansadas pernas, mais pelos do que pernas. Minhas barbas arranhavam suavemente meus joelhos sujos. As vezes esfregava fortemente os dedos contra a testa e os olhos, numa angústia descontroladamente presente. Era capaz de arrancar um dos calos das mãos com as unhas. O meu corpo nunca se fez tão presente como naquele momento: era apenas ele que eu sentia. Alias, ele era a primeira e ultima coisa que eu sentia. Apesar de estar preso, estava longe. Minha mente passeava por todos os lugares que vivi nestes últimos dois anos.
O medo se faz presente, mas o que mais me espanta é a culpa. Não era por acaso que eu estava ali. Mesmo tendo convicção da minha inocência, sei que contribui para esse fim. Era como se eu também concordasse em ter que sofrer essa punição como esperança corretiva da minha condição.
Com minha anuência, resolvi enfrentar a situação de temor e culpa. Não queria viver isso, sentir essa dor, mas era necessária. Parecia o fim. Realmente estava chegando ao fim. Sei que terei que ficar nessa cela por um bom tempo e apenas eu concederei minha liberdade. É hora de calar-se.

sábado, 30 de abril de 2011

Síndrome da Flexibilização de Valores



Tudo começou com uma simples observação: ou eu o tempo estava me deixando ainda mais careta, old, quadrada, ou a juventude estava flexibilizando cada vez mais os valores e conceitos. Percebi um conjunto de sinais apresentados pelos jovens que me induziriam a acreditar na segunda hipótese:

Redução de satisfações à sociedade
Priorizar questões individuais
Relativização dos julgamentos (certo ou errado)
Grande elevação no número de relacionamentos “abertos”
Pouca importância com os conflitos do outro
Diminuição do apego
Comportamentos frios e superficiais
Maior importância para os fins do que para os meios
Dificuldade com a estabilidade
Influenciáveis
Relações instantâneas, intensas e descartáveis
Facilidade de se reconfigurar


Síndrome é o conjunto de sintomas e sinais que definem uma mesma patologia. A flexibilização de valores é a conseqüência mais visível para a acumulação de todos os sintomas acima apontados: os valores não são mais estanques, ajustados, definidos em si mesmos; eles são fluidos, misturados e relativizados. Mês passado aquela dúvida que citei no início deixou de existir: a síndrome da flexibilização de valores é real. Sabe o pior? Não é privativo dos jovens, mas sim da sociedade.


Hoje somos engolidos pelo sistema: trabalhamos muito para consumir aquilo que nos fazem acreditar que é uma necessidade. A mudança é constante. O tempo e o espaço foram reduzidos com a velocidade da internet e da comunicação on-line. A adaptação, que sempre foi marca da evolução da espécie, passou a ser exigida cada vez mais devido às inúmeras e intensas mudanças. Estamos imersos e regulados por aquilo que Max Weber conceituou como racionalidade instrumental. Entende-se por esta razão aquela cuja “ação que se baseia no cálculo, na adequação de meios e fins, procurando obter com um mínimo de dispêndios um máximo de efeitos desejados, evitando-se ou minimizando-se todos os efeitos colaterais indesejados.” (FREITAG, 1994, p.90). Diante disso percebemos que a grande conseqüência dessa racionalidade instrumental aliada à redução do tempo e espaço do mundo moderno foi a perda da autonomia do indivíduo. O que isso quer dizer? Que os indivíduos passaram a ser comandados pelo sistema em toda sua inteireza. Ingenuidade acreditar que a razão instrumental regularia apenas as relações trabalhistas: ela se expande para as relações sociais.

“Você viu como a nossa arma estava afiadinha? Você viu o estrago que ela fez?” Essa foi a constatação de um dos suspeitos de ter vendido a arma utilizada por Wellington Menezes de Oliveira, responsável pelo massacre na Escola Municipal Tasso da Silveira, no Rio de Janeiro. O cenário de dor e sofrimento foi irrelevante diante da eficácia do produto vendido pelo sujeito. Essa razão que norteia essa criatura é a mesma que explica as corrupções, assassinatos, além de pequenos atos de um cidadão tido como comum. Não quero dizer que qualquer cidadão seria capaz de emitir esse comentário, o quero expor é que esse pensamento é resultado da falta de autonomia a qual falei anteriormente.

A constante mudança, intensa rapidez com que as informações, padrões, sistemas e processos são reformulados, substituídos, descartados e reconstruídos permite o afrouxamento de algumas estruturas do indivíduo. Zigmunt Bauman utilizou em seu livro Modernidade Líquida a metáfora da “fluidez” ou “liquidez” para caracterizar a contemporaneidade. É justamente essa fluidez que permite a reorganização das moléculas para a adequação ao espaço a ser ocupado.

Antigamente poderíamos caracterizar a sociedade como resistente, onde o sagrado era evidenciado, havia maior valorização do passado, das crenças e das tradições. As mudanças sempre estiveram presentes e demandavam a adaptabilidade e transformação do indivíduo, porém como a sua constituição era sólida, essa transformação constituía-se em lapidações, na qual se preservava a essência indivíduo, sendo impossível acoplar um quadrado num espaço circular. As mudanças continuaram e nesse contexto, os primeiros sólidos começaram a se derreter para permitir uma melhor adaptação. Bauman continua seus estudos constatando que a modernidade fluida repercutiu numa grande alteração na condição humana com tendência de desenvolvimento nos conceitos básicos da emancipação, individualidade, tempo/espaço, trabalho e a comunidade. O tempo e o espaço são extremamente reduzidos. A modernidade concentra esforços para alcançar rapidamente um objetivo que se distancia cada vez que se aproxima. O homem moderno é aquele cuja estagnação é impensável. Nas organizações, nos deparamos com a geração Y, folgados, distraídos, superficiais e insubordinados. Não “vestem a camisa da empresa”, pois não tem compromisso de fidelidade e lealdade a ela – “vou para quem me der mais”. É necessário estar sempre à frente, o que inviabiliza uma construção sólida para sustentar todas essas contínuas e repentinas transformações. A identidade é desprezada, pois não existe identidade essencial na liquidez: a “identidade” na liquidez depende do ambiente. Qual o reflexo dessa instabilidade da modernidade na construção do indivíduo? A instabilidade do próprio indivíduo.

Como posso manter a integridade dos valores numa modernidade líquida? Além disso, como posso construir valores, conceitos e até mesmo uma identidade num tempo de fluidez da sociedade? Se a construção do indivíduo está sendo afetada com essa mudança social, imagina as relações sociais: descomprometidas, desacreditadas, descredibilizadas. A frieza e desumanidade da frase emitida pelo suspeito de vender a arma para o assassino do Realengo reflete seu descompromisso e insensibilidade com o coletivo. O que podemos fazer para evitar a síndrome de flexibilização de valores decorrente da racionalidade instrumental? Discussão para o próximo post.




FREITAG, Bárbara. A teoria crítica: ontem e hoje, São Paulo: Brasiliense, 1994


BAUMAN, Zigmunt. Modernidade Líquida. São Paulo: Zahar, 2001.

quinta-feira, 24 de março de 2011

Eu e meu eu-lírico: Juventude e boa vontade

Eu e meu eu-lírico: Juventude e boa vontade: "É inevitável falar sobre os jovens de hoje em dia sem fazer uma comparação com a geração anterior. Costumo ouvir que a juventude atual é aco..."

domingo, 20 de março de 2011

Dia da Mulher


Dia Internacional da Mulher! Minha mente já está condicionada a pensar na figura delicada, meiga e linda, sempre ao lado de uma bela rosa vermelha. Uma poesia dedicada à beleza da mulher, ao equilíbrio entre a sutileza e força. Uma declaração de amor do marido, reconhecendo a dedicação da sua esposa. Uma mensagem empresarial reconhecendo o crescimento das mulheres (em números e resultados) na organização. Sugestão para presentes: flores! Enfim, clichês.

Os clichês têm seu lugar. Primeiro porque, se virou clichê, é porque houve repetições. Se houve repetições é porque houve aceitações. Portanto, os clichês, em algum momento, satisfizeram a maioria. O problema do clichê é a previsibilidade... Resultado? Elas cansaram de serem homenageadas com esses clichês.

Hoje elas são mais do que independentes, ousadas, inteligentes, guerreiras. As mulheres de hoje: “pães” (pai+mãe); “solteiras sim, sozinhas nunca”(mulher melancia); “mulher não trai, mulher se vinga” (aviões do forro); “arranjar um amor só pra me distrair” (Alcione); “quantos homens me amaram, bem mais e melhor que você” (Chico); “contornei” (Márcia, Zorra Total); “Sexo sem compromisso (filme que preciso assistir!)”. Vamos “retirar todo o lençol” e mostrar que elas não precisam mais só da auto-afirmação do equilíbrio: esposa-mãe-trabalhadora. É preciso auto-afirmar a relação da mulher com sua sexualidade. Sem pudores, vergonha ou preconceito.

Hoje elas são gays, bi e mães. Optam pela produção independente ou por não terem filhos. Por não casar ou por trair. Têm vários parceiros ao longo da vida. Beijam amigos e amigas (e às vezes transam), sem compromisso. Realizam suas fantasias. Partem para a conquista! Tomam atitude. Dão na primeira noite. Por favor, não vamos entrar no mérito da promiscuidade. O discurso gira em torno da flexibilização dos pré-conceitos do século passado. Àquele que julgar uma mulher como vadia por ter transado na primeira noite é tido como, no mínimo, limitado (que o diga Diogo do BBB11). Vamos tomar por referência aquela mulher linda, meiga, educada, jovem e independente: ela pode fazer tudo e manter sua saúde sexual e sua idoneidade. Hoje, elas podem!

A história começou com os clichês, onde a homenagem das mulheres era regada à flores, poesias e declarações. O que fazer para sair desses clichês? Continuam as flores, poesias e declarações – pois elas adoram. Elas querem também ser reconhecidas pelo lado loba. Está na hora de acabar com o tabu que é a libido feminina. Quebrar esses limites machistas já rachados pela ascensão financeira das mulheres. Homens: presenteie-as com lingeries e brinquedos; músculos e inteligência; preliminares e rapidinhas; lealdade e virilidade. Cuidem-se e compareçam com qualidade, afinal elas querem, merecem e terão (estando vocês presentes ou não).

sábado, 19 de março de 2011

Comecei faltando dois dias na semana. Depois uma semana. Depois um mês. Já são três meses sem “academia”! O pior é isso. Já sinto os sinais da ausência dos exercícios. Pensamento lento, sensação de ultrapassada, desatualizada, restrita e o pior, vazia. Agora é recomeçar. Preciso enfrentar novamente o recomeço. Tive que me forçar a dar o primeiro passo, publicando esse desabafo no blog (nada a ver), mas tudo bem.

Em breve novos conteúdos.